A Semana Macro (16/02) – Atividade, Assusta?

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Olhando o tombo do varejo, fica difícil não se questionar sobre a recuperação econômica em 2021. As vendas de dezembro divulgadas pelo IBGE caíram 6.1% em relação a novembro, muito abaixo dos -0.7% esperados pelos economistas. E para o início do ano, os indicadores preliminares só tem confirmado a fraqueza do consumo. Seria todo aquele otimismo uma miragem causada pelo auxílio emergencial? Seguimos convictos que não, mas vale ponderar a respeito. De fato, nunca foi razoável imaginar que o consumo no Brasil sairia da crise mais forte do que nela entrou. Em algum momento esta correção viria. Na verdade, os vetores de crescimento este ano são outros e permanecem firmes. De um lado, o setor exportador continuará  sendo dinamizado pelo crescimento mundial, alta das commodities e câmbio depreciado. De outro, os investimentos devem seguir em expansão apoiados por um ambiente de juros historicamente baixos. Mantemos nossa projeção de crescimento de 4.2% este ano. Aos detalhes:

Chamaram a atenção os números surpreendentemente ruins do varejo de dezembro divulgados na semana passada. O índice restrito encolheu -6.1% em relação a novembro, muito abaixo do consenso de mercado (-0.7%). O índice ampliado (que inclui veículos e materiais de construção), caiu um pouco menos mas também assustou: -3.7%.  De fato, a queda foi generalizada, atingindo todas as categorias.  Efeito puro e simples do fim do auxílio emergencial? Difícil dizer, mas valem algumas considerações. Em primeiro lugar, o auxílio ainda foi pago em dezembro em sua última parcela. Sobre o efeito da redução do valor de R$600 para R$300, vale lembrar que para maioria dos beneficiados o corte já tinha ocorrido 2 meses antes e os números do comércio de outubro e novembro não parecem ter sofrido muito. Outra hipótese pode ser a de que os consumidores seguraram antecipadamente seus gastos ao perceber que aquele provavelmente seria o último mês de auxílio. Também parece ter pesado as mudanças de hábitos de fim de ano em tempos de pandemia. O mês de dezembro costuma ser sazonalmente mais forte justamente pelo clima de confraternização e interação social, indo dos presentes de natal e amigo secreto ao capricho no look para as festas. Sem festas, sem consumo.

https://twitter.com/FundoVersa/status/1359472469472665602

Outros dois fatores também parecem ter contribuído para a fraqueza do comércio. O primeiro foi a alta atípica de 1.35% na inflação naquele mês, corroendo o poder de compra do consumidor. O segundo foi o adiantamento do 13º das aposentadorias feito no início da pandemia, reduzindo o fluxo de pagamentos de dezembro em algo como R$ 20 bilhões. Ou seja, sobram explicações (depois do fato, vale dizer) para a queda das vendas em dezembro.

O que dizer dos números para o início do ano? Infelizmente, também não faltam ruídos para dificultar a leitura. Em primeiro lugar, há o efeito do recrudescimento da pandemia na mobilidade social.  Embora não haja muitos sinais de descontrole da doença como aquele visto em Manaus no resto do país, os óbitos e hospitalizações seguem persistentemente altos na maioria das regiões, dificultando qualquer flexibilização no curto prazo. As perspectivas para a vacina parecem bastante promissoras, mas seu efeito só deverá aparecer daqui pelo menos dois ou três meses. Vale lembrar que os casos graves estão majoritariamente concentrados em idosos e outros grupos de risco. Só os idosos representam 80% dos óbitos por covid no Brasil. Com a vacinação destes grupos, que representam menos de 20% da população, já deveremos ver uma queda drástica dos casos graves no 2º trimestre. Em segundo lugar, o fim do auxílio emergencial continuará pesando nas vendas do varejo nos próximos meses. O novo auxílio a ser anunciado em breve deve ajudar, mas os valores pagos serão menores e o número de beneficiários mais reduzido. Enquanto nos primeiros meses do auxílio eram injetados na economia algo como R$65 bilhões por mês, em dezembro foram apenas R$20 bi e especula-se algo abaixo de R$10 bi nesta nova rodada.

Desta forma, podemos afirmar que a queda do varejo de dezembro surpreendeu mais por ter sido naquele mês do que propriamente pela queda. Nunca foi razoável acreditar que o consumo saísse da crise mais forte do que entrou nela. Mesmo com a reabertura total (assim esperamos) da economia este ano, a taxa de desemprego quase certamente ficará mais elevada do que foi antes da pandemia. Atividades intensivas em mão de obra e empresas de menor porte foram as mais atingidas pela crise, e muitas fecharam permanentemente. Até novembro as vendas do varejo rodavam 7.5% acima dos níveis pré-pandemia. Com o resultado de dezembro, ainda acumulam alta de 0.8%. Ou seja, parece ainda haver alguma margem para piora destes indicadores nos próximos meses.

Se as perspectivas para o consumo não animam muito, seria natural questionar de onde viria nosso otimismo com a recuperação este ano. Na verdade, os vetores de crescimento são outros e, em nossa visão, permanecem firmes. De um lado, o setor exportador continuará  sendo dinamizado pelo crescimento mundial, alta das commodities e câmbio depreciado. De outro, os investimentos devem seguir em expansão apoiados por um ambiente de juros historicamente baixos. Escrevemos sobre isto em nossa primeira carta do ano e de lá para cá pouca coisa mudou. De toda forma, alguns gráficos são bem vindos:

Abaixo mostramos a correlação impressionantemente alta entre o crescimento do PIB brasileiro e as variações nos preços internacionais das commodities. Ironicamente, poderíamos chamá-lo de gráfico da “República de Bananas”, pois mostra como nossos ciclos de crescimento são extremamente dependentes das flutuações da demanda mundial por commodities, nossos principais produtos de exportação. A crise de 99, o boom econômico da era Lula, a crise de 2015 e impeachment, todos estes eventos parecem andar juntos em algum grau com estas flutuações.

Gráfico 1: Crescimento do PIB do Brasil e variação do preço das commodities (var% 12m acumulada)

Fonte: Bloomberg, IBGE e Versa Asset

Por último, o gráfico abaixo ilustra a evolução de dois componentes da produção industrial estritamente ligados aos investimentos: bens de capital e insumos típicos da construção civil. Em dezembro estas categorias registravam altas respectivamente de +20.5% e +35.4% em relação a dezembro de 2019! Com esses números na conta, o banco Itaú estima que o nível de investimentos em dezembro já esteja 11% acima dos valores pré-pandemia. Diferentemente dos dados de varejo, é difícil argumentar que este desempenho estaria sendo inflado pelo auxílio emergencial. Com investimentos em alta e estoques em níveis historicamente baixos, e bem possível que a fraqueza no comércio e recrudescimento do covid neste início de ano não façam este estrago todo nos números do PIB. Por ora, nossas estimativas em tempo real para o PIB do 1º trimestre apontam estabilidade em relação ao 4º trimestre. Se este for realmente o caso, não nos parece tão difícil crescer acima de 4% este ano. Dito isto, mantemos nossa projeção de 4.2% em 2021.

Gráfico 2: Produção Industrial Mensal – Bens de Capital e Insumos da Construção Civil

Fonte: IBGE e Versa Asset







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